sexta-feira, 26 de outubro de 2007

Aflição




Adiante era o frio, mais atrás era o raio de sol.
uns pés passos largos; outra vez, caminhar devagar.
Entre o tremer e o abrasar, um modo
como se fosse o existir não mais que passar.

Para onde é que vou?

Se meço ou se me perco, se fio ou se desteço;
contar os números é para os sábios, eu só observo.
Fazer um círculo, desenhar quadrado:
a geometria é para quem sabe recomeçar.

Por que é que eu fico?

Minha história é sem início, não determina seu fim;
um dia perguntarão se fui gente ou estátua de sal.
Quando derem por minha ausência estarei
com meus olhos de saudade fitados para atrás.

Onde nos encontraremos?
Quando, o tempo de repousar?
.
.
.

domingo, 21 de outubro de 2007

Instante




Ilícito é
o espaço feito
(o ar é rarefeito).

Evaporam-se mitos
(tantos e muitos).

Somem ideais
(ficam os pudores).

Esta é nossa era
(falta quimera).

A vida é
contraste das cenas
(as histórias parecem pequenas)

dos takes
(o mortos não passam de enfeites)

das sinas
(as pessoas dobram suas esquinas).

dos caminhos
(cada bêbado com seu vinho)

Você é a vida,
o primeiro e o último cálice
da impureza dos extremos.

Você é a vida
desde o primeiro instante.

Você é a vida,
até o último dia.

Você é a vida
desde o primeiro momento
até o último cálice.
.
.
.

sexta-feira, 19 de outubro de 2007

O amor dos poemas



Tira, teu coração
é fardo tão leve —
eu tive o meu
tão puro e massa
dura —toma, é tudo
o meu tombo de castelo
no que tenho medievo
canção de gesta, amigo
e de amor resta

que te guardo cancioneiro
que te guardo um dia tido
e nenhum dia verdadeiro.

quinta-feira, 18 de outubro de 2007

Poema de conveniência



Convém dizer que os sonhos não morrem,

mas que são povoados de figuras sem paisagem:
como trouxesse numa fita um recorte, morro somente
por aquilo que quero morrer, pelo desejo de perda
e desejo de posse tanta, por aqueles que morrem.

Existe na escuridão da linha em branco passagem,
feita de traço, formando no poema acidente,
construindo a razão e a função de todos os sucessos
que passam por nós e nos tocam com azar ou sorte
os sentidos e a alma, do fio do cabelo à boca do estômago.

E o que fazemos, e o que deixamos, é um sonho para ser
aperfeiçoado em figuras em série, de paisagem branca
recorte de traço, morte de tudo, como num ciclo
semente de vida, mero acidente, seqüência de ganho
mais sonho de perda, passagem sem linha e dizer de posse
pois convém dizer que os sonhos não morrem jamais.


domingo, 14 de outubro de 2007

O que é literatura?

Encontrei este artigo neste link e gostaria de compartilhar. Tem tudo a ver com este blog, que é sobre literatura, principalmente poesia e, também, com a arte dos blogs em geral, quer é a escrita com criatividade. Veja:


Que é Literatura?
Segundo o crítico e historiador literário José Veríssimo, várias são as acepções do termo literatura: conjunto da produção intelectual humana escrita; conjunto de obras especialmente literárias; conjunto (e este sentido, creio, nos velo da Alemanha) das obras sobre um dado assunto, ao que chamamos mais vernaculamente bibliografia de um assunto ou matéria; boas letras; e, além de outros derivados secundários um ramo especial daquela produção, uma variedade de Arte, a arte literária.
Mas por que à simples relação de fatos, à meia expressão de emoções por meio da escrita chamamos arte como à pintura, à escultura, à música?
Talvez porque essa relação ou essa expressão - e em literatura não há outra coisa - admitem ou exigem, para nos comoverem e Interessarem, artifícios de língua, de maneira de dizer de modos de contar ou exprimir, em suma de expedientes e processos estranhos à pura necessidade orgânica da manifestação dos nossos juízos e sentimentos. Para tal, bastaria somente a correção gramatical, isto é, a expressão verbal, segundo as leis lógicas ou naturais, se preferem, da linguagem, sem mais artifícios que os que lhe são inerentes.
A exação puramente lingüística na expressão do pensamento ou das sensações é talvez para a arte de escrever o que o desenho, no seu sentido mais restrito e especial, é para a pintura. Esse desenho, como aquela linguagem simplesmente exata, é, certo, já de si um artifício de representação, mas ainda não constitui uma arte. Por falta de outros artifícios que a completem e a tornem significativa, o que representa não nos logra ainda comover, que é o fim superior da arte. E se o simples desenho, na mão de verdadeiros artistas, o consegue, é que uma combinação especial de linhas, de tons, de sombras e claridades, produzindo uma expressão que quase vale a pintura, fez dele mais alguma coisa que pura representação por linhas combinadas segundo regras preestabelecidas.
São essas linhas especiais, esses tons variados, essas sombras e essa luz no desenho artístico, e as tintas, o claro-escuro, as gradações de cores, a harmonia geral de todos esses elementos na pintura, que fazem da pintura representação gráfica do desenho uma obra de arte. Assim na expressão escrita são artifícios correspondentes a esses que fazem da simples representação versal das coisas vistas ou sentidas uma arte - acaso a mais difícil de todas. Mas se isto basta para fazer da escrita, da literatura, no sentido etimológico, uma arte, um ramo de Arte, não satisfaz, cuido eu, para caracterizá-la toda.
Obras há de ciência (e tomo esta palavra no sentido geral de saber de conhecimentos de fatos, "know-ledger" em Inglês), tão bem escritas como as que melhor o sejam literatura. Darwin passa por um perfeito escritor na Inglaterra, assim, como Spencer. Imagino que os trabalhos de física e de biologia de Goethe não serão menos bem escritos que os seus romances. (Que é literatura? José Veríssimo).
Em O Que é a Literatura?, publicado em 1948, por Jean-Paul Sartre, a função e a natureza da Literatura encontram-se organizadas em três perguntas básicas:
• O que é escrever?• Por que escrever?• Para quem escreve?

O que é escrever?
Segundo Sartre, escrever é uma ação de desnudamento. O escritor revela ao escrever, revela o mundo, e em especial o Homem, aos outros homens, para que estes tomem, em face ao objetivo assim revelado, a sua inteira responsabilidade. Não basta ao escritor ter escrito certas coisas, é preciso ter escolhido escreve-las de um modo determinado, expondo seu mundo, com elementos estéticos, de criação literária.

Por que escrever?
O homem que escreve tem a consciência de revelar as coisas, os acontecimentos; de constituir o meio através do qual os fatos se manifestam e adquirem significado. Mesmo sabendo que, como escritor, pode detectar a realidade, não pode produzi-la; sem a sua presença, a realidade continuará existindo. Ao escrever, o escritor transfere para a obra uma certa realidade, tornando-se essencial a ela, que não existiria sem seu ato criador.

Para quem escreve?
Ao escrever, o escritor, segundo Sartre, deve solicitar um pacto com o leitor, que ele colabore em transformar o mundo, a sua realidade. O escritor dirige à liberdade de seus leitores. A Literatura é a tentativa do homem-escritor de criar uma realidade que possa ser exibida no mundo real e modificar as estruturas da sociedade humana.


sexta-feira, 12 de outubro de 2007

Um Texto de Ruth Rocha - O dia em que eu mordi Jesus Cristo

Hoje é dia das crianças Para comemorar resolvi postar um texto da escritora Ruth Rocha. Um pouco longo, mas muito bom. Aproveite e imprima esse texto, leia para seu filho, seu sobrinho, ou qualquer outra criança que você conheça. Leitura também pode ser uma diversão para as crianças.



O dia em que eu mordi Jesus Cristo

Eu estava numa escola onde não tinha aula de religião.
E todos os meus amigos já tinham feito a primeira comunhão, menos eu.
Então me deu uma vontade danada de fazer primeira comunhão. Eu nem sabia direito o que era isso, mas falei pra minha mãe e pro meu pai e eles acharam que até podia ser bom, que eu andava muito lavada e coisa e tal, e me arranjaram uma tal de aula de catecismo, que era na igreja.
Aí eu não gostei muito, que todo sábado de manhã, enquanto meus amigos ficavam brincando na rua, eu tinha que ir na tal aula. Eu ia, né, e aí eu arranjei uns amigos e tinha uma menina boazinha que vinha me buscar que ela também ia na aula e a gente ia pra igreja rindo de tudo que a gente via.
E na aula a gente aprendia uma porção de coisas, e tinha uma que eu achava engraçada e que era uma rezinha bem curtinha, que se chamava jaculatória. Eu achava esse nome meio feio, sei lá, me lembrava alguma coisa esquisita...
E o padre uma vez mostrou pra gente um livrão, que tinha uma figura com o inferno e uma porção de gente se danando lá dentro.
E a gente tinha que aprender a rezar a Ave-Maria e o Padre-Nosso e o Creindeuspadre.
E tinha um tal de ato de contrição, e uma tal de ladainha, que a gente morria de rir.
E aí a gente começou a aprender como é que se confessava, que tinha que dizer todos os pecados pro padre e eu perguntava pro padre o que era pecado e ele parece que nem sabia direito.
Quando eu chegava em casa e contava essas coisas, meu pai e minha mãe meio que achavam graça e eu comecei a achar que esse negócio de primeira comunhão era meio engraçado...
E aí o padre começou a explicar pra gente como era a comunhão e que a gente ia comer o corpo de Cristo, que na hora da missa aquela bolachinha chamada hóstia vira o corpo de Cristo.
Eu estava muito animada era com o meu vestido novo, que era branco e era cheio de babados e rendas, e na cabeça eu ia botar um véu, que nem a minha avó na missa, só que o meu era branco e mais parecia uma roupa de noiva.
E eu ganhei um livro de missa lindo, todo de madrepérola, e um terço que eu nem sabia usar, minha mãe disse que antigamente as pessoas rezavam terço, mas que agora não se usava mais...
E o dia da comunhão estava chegando e a minha mãe preparou um lanche, ia ter chocolate e bolo e uma porção de coisas, que a gente ia voltar bem depressa da igreja, que quem ia comungar não ia poder comer antes da missa. E era só eu que ia comungar.
E eu perguntei pra minha mãe por que é que ela nunca comungava e ela disse que um dia desses ela ia.
E eu perguntei por que é que o meu pai nunca ia na igreja e ele disse que um dia desses ele ia.
E aí chegou a véspera da minha comunhão e eu tive de ir confessar. E eu morri de medo de errar o tal ato de contrição e na hora que eu fui confessar mandaram eu ficar de um lado do confessionário, que é uma casinha com uma janelinha de grade de cada lado e um lugar de cada lado para ajoelhar, e o padre fica lá dentro.
Eu ajoelhei onde me mandaram e aí eu ouvia tudo que a menina do outro lado estava dizendo pro padre e era que ela tinha desobedecido a mãe dela e o padre mandou rezar vinte Ave-Marias.
Eu fiquei meio que achando que era pecado ouvir os pecados dos outros, mas como ninguém tinha falado nada pra mim eu fiquei quieta, e quando o padre veio pro meu lado eu fui logo falando o ato de contrição: eu pecador me confesso e o resto que vem depois.
E eu contei os meus pecados, que pra falar a verdade eu nem achava que eram pecados, mas foi assim que me ensinaram. E aí o padre disse uma coisa que eu não entendi e eu perguntei “o quê” e o padre disse "vai tirar o cera do ouvido”. E eu disse “posso ir embora?” e ele disse “vai, vai logo e reze vinte Ave-Marias”. E eu achei que ele nem tinha escutado o que eu disse e que ele que precisava tirar a cera do ouvido.
No dia seguinte eu botei o meu vestido branco e eu não comi nadinha, nem bebi água, e nem escovei os dentes, de medo de engolir uma aguinha.
E eu estava morrendo de medo, que todo mundo tinha dito que se a gente mordesse a hóstia saía sangue.
A igreja cheirava a lírio, que é um cheiro que até hoje eu acho enjoado.
As meninas e os meninos que iam fazer primeira comunhão ficavam lá na frente, nos primeiros bancos e davam pra gente uma vela pra segurar.
O padre foi rezando uma missa comprida que não acabava mais e às tantas chegou a hora da gente comungar e as meninas foram saindo dos bancos e foram indo lá pra frente e ajoelhando num degrau que tem perto de uma grade.
E o padre veio vindo com uma taça dourada na mão e ele tirava a hóstia lá de dentro e ia dando uma por uma para cada menina e menino.
Aí chegou a minha vez e abri bem a boca e fechei os olhos que nem eu vi as outras crianças fazerem e o padre botou a hóstia na minha língua. Eu não sabia o que fazer, que morder não podia e a minha boca estava sequinha e a hóstia grudou no céu da boca eu empurrava com a língua e não desgrudava e enquanto isso eu tinha que levantar e voltar pro meu lugar que já tinha gente atrás de mim querendo ajoelhar.
E eu nem aprestei atenção e tropecei no vestido da Carminha e levei o maior tombo da minha vida.
É claro que eu fiquei morrendo de vergonha e eu levantei e nem prestei atenção se eu tinha machucado o joelho. O que estava me preocupando mesmo é que eu tinha dado a maior mordida na hóstia.
Eu estava sentindo tudo que é gosto na boca, que devia de estar saindo sangue da hóstia, mas não tinha coragem de pegar pra olhar.
Aí eu pensei assim: “se eu não olhar se saiu sangue agora, nunca mais na minha vida eu vou saber se é verdade essa história”.
Aí eu meti o dedo na boca e tirei um pedaço da hóstia, meio amassado, meio molhado. E estava branquinho que nem tinha entrado.
E foi assim que eu aprendi que quando as pessoas falam pra gente coisas que parecem besteira não é pra acreditar, que tem muita gente besta neste mundo!


quinta-feira, 11 de outubro de 2007

Poema



Eu vim falar das coisas que vi
no palácio, e nas guerras, e nas danças;
eu vim falar das lutas, e da razão
do poema que eu faço, e da donzela:
minha meiga donzela do paço sem flores
segui meus rastros, senti os meus laivos,
tão longe laivos, delírios da terra do Lácio.

Eu te faço o que pediu, com letras
eu te dou o sol, e a lua, o drama
onde também cabe a fome, e a morte,
e o que é que espera, e buscando-a
dou-te amor até a velhice, junto
como se morasse, como se dormisse e bem gostasse
e todo gesto teu fosse comigo o que é
contigo o meu gesto no papel,
este poema, torto, sem medo, rápido
para não te lembrar como quero
mas para que sejas, para o que é
você, descolorida, dura, sem ser
bicho ou gente; e ser apenas palavra,
verso e estrofe; forma e conteúdo.

Meu poema antes amante, é antes meu
poema d’antes, qual sabe de qualquer
amor, sujeito, verbo, fúria ou lentidão
que eu te faço de cor como já te soubesse
meu coração sem nada, e depois o dou
para que possa amá-lo, e amando-o
possa você me conhecer pelo que te dou,
e me amando, eu possa reconhecer você
amante mais em carne que papel e pena.
Assim, presente nas coisas do mundo
presente no que me pede, no tempo
deste instante, meu poema de amor.

Waly Salomão - um bom mestre

Às vezes me convenço de que sou realmente poeta. Uma vez estava numa Bienal do Livro, realizada a algum tempo em São Paulo, observando alguns livros, quando escutei uns gritos vindos detrás de mim. Por alguns instantes ignorei, pois era tanta gente que havia no local que pensei poder ser para qualquer pessoa aqueles gritos. Na verdade não eram gritos, mas um "psiu" de uma voz masculina. Como eu não me voltara par atrás e a voz insistia bastante olhei despretensiosamente, como deixa os olhos seguirem os movimentos das pessoas. Era ninguém menos do que o saudoso poeta Waly Salomão.

"Poeta, poeta, é você mesmo que olhou."
"Eu?"
"É você mesmo, você escreve?
"Sim,"
"A gente conhece um poeta de longe!"
"Só estou começando..."
"Mas tu tem jeito."

E uma conversa bastante proveitosa se desenrolou. Depois ele me ensinou bastante coisa sobre poesia. Foram bons aqueles dias.

Resolvi continuar publicando. Em breve estarei publicando um novo livro, mais uma coletânea de poemas meus. Que pena Waly não estar mais aqui...
Nos links abaixo você poderá ler mais poesias deste grande autor:


Poesias de Waly Salomão aqui

Mais poesia de Waly Salomão


quarta-feira, 10 de outubro de 2007

História secreta


Ninguém sai ileso de ouvir palavras
de amor d’antes de épocas de rainhas
e de donzelas, d’antes de descrições vãs
contidas num vaso de porcelana chinesa.

Porque bate um coração duma dona,
porque vêem os olhos movimentos de
cores no ar, simplesmente porque são
palavras de amor o que há nos gestos.


Fica o silêncio na percepção dos seres,
e um papel ou um desenho contendo
o amor d’antes a estranheza dos homens
pode mudar uma vida, fazer cair o céu.

Porque bate um coração duma dona,
porque ainda vive de sonhos o senhor,
dono do amor, caído de braços abertos,
porque nada pára, como a vida assim exige -

como corre um rio que não volta mais,
não como um tambor vazio que inundou.

Sobre o tratado da fúria e da lentidão - parte II

Conforme prometido aqui vai s segunda parte de uma teoria poética pouco convencional e explicada de modo bastante simplista. Caso naáo tenha lido a primeira parte veja um dos posts post abaixo ouprocure nos marcadores pelo tema "teoria furiosa".
Irei explicar primeiramente sobre o que é a fúria na poesia. Bom, quando se escreve um poema uma imagem (ou muitas imagens) aparecem na mente de quem escreve para surgirem, então, novas estórias e novos temas poéticos dentro do próprio texto ou de outros que serão escritos.
Não se deve esquecer que em meio às imagens poéticas há um ser de carne e osso, com vida real, que respira e anda como qualquer ser humano. Portanto há uma vida, um cotidiano onde a pessoa, neste caso o poeta, encontra-se com outras pessoas, apaixona-se, rebela-se e, assim, observa tudo ao seu redor para emitir sua opinião. É nesse contexto que pode surgir uma pergunta: o que faz uma pessoa ser poeta e outra não? Eu respondo: o que faz um ser humano ser médico e outro não? ou ainda, engenheiro mecatrônico, ou fisioterapeuta etc. Para dizer a verdade, não há uma resposta, mas o ato de escolher ser poeta é um fato que é, antes de tudo, peculiar ao restante dos mortais. Primeiro porque é algo individual e solitário (uma idéia que parece ser quase loucura para a sociedade moderna, mas ao mesmo tempo está em conformidade com o pensamento do modo de vida atual); segundo porque aquele que escreve poesia é um homem (no sentido geral da palavra), logo, um ser pensante. Então, todo mundo pode ser poeta?, pode perguntar alguém antecipadamente, e eu digo não. Acontece que o poeta possui habilidades de poeta, assim como o médico possui certas habilidades inerentes ao exercício de suab profissão. Ora, escrever é para o primeiro, como receitar é para o segundo.
Assim é a vida, com todas as suas diferenças, cada um vê o mundo a sua maneira. Enquanto alguns são mais matemáticos, outros são poéticos.
Ao escrever um poema junta-se tudo, sonho e realidade em imagens que, por sua vez são traduzidas por palavras; bem como uma imagem equação matemática pode ser convertida em figuras num programa de computador.
A expressão de um cientista é diferente da expressão de um artista, embora ambos possam falar de um memso assunto.
Para o poeta tudo passa pelos olhos. Mesmo quando é um devaneio pode-se dizer que existe a necessidade de enxergar, de visualizar o que está se dizendo no poema. O texto vai se configurando devagar, como a tessitura de uma vestimenta. Inconscientemente, ou não, o escritor procura um fator (ou estímulo) externo. Ocorre, dessa maneira, o que chamamos aqui de visão lenta do contidiano. Não existe ninguém que possa encontrar algo que procure se fazer isto de forma rápida e desleixada. Há nesta entrega da procura um ardor, o poeta dá-se por total a este ato de encontrar (ou deixar-se ser encontrado) pela imagem que estimule sua poesia. Daí resulta a teoria da fúria e da lentidão.
Imaginemos uma flor que se abre. Imagine, agora, ela se abrindo passoa a passo. Quanto tempo isto leva? Quantas pessoas já presenciaram este fenômeno? Eu vi isto somente em documentários sobre a natureza, onde existe uma câmera deixada por muitos dias no lugar onde está a flor e. Depois de gravada a imagem, o editor acelera as imagens para vermos todas as fases das pétalas se abrindo.
O poeta é assim, como um cineasta. Grava o que acontece em câmera lenta perto de nós, mas ninguém observa por ser tão lento que, se parássemos para observar não faríamos mais nada durante aquele dia. Daí a falsa impressão de que o poeta não faz mais nada da vida ou que o poeta é um eremita. Não o é.
O escritor observa tudo o que é "fato de vida". Uma criança dentro da barriga da mãe é um fenômeno lento e devagar, a formação do corpo humano é lento e furioso, ou seja, é expontâneo, devagar e pouco observado no que diz respeito a cada segundo de crescimento do feto.
Fúria e lentidão, então, está presente em tudo o que acontece naturalmente, como qualquer movimento de esticar um braço para se pegar um objeto que está longe, ou bocejar pela manhã. Não há muita explicação porque simplesmente acontece. São poucas as pessoa sque observam e vêem as coisas ao redor em câmera lenta, em slow motion como diriam os cineastas.
Enfim, iste assunto poderia se estender por horas, mas continuaremos num próximo post. Por enquanto é tudo e nada mais. Abraços a todos.

domingo, 7 de outubro de 2007

Construção


Qualquer palavra é menos que a sensação
e o pensamento de um engenheiro na construção
faz uma aquarela caindo braços, levando amor
no dar-se ao amante como às suas pedras.

Qualquer palavra morre num momento
em que se avivam os olhares antes cegos,
numa razão impetuosa do ser, diante os corpos
equilibrados em seus elementos químicos.

Não há amor nem matéria no poema
que a palavra é qualquer coisa sem tempo
e só um pensamento a esculpir uma estátua.

E duma imagem real na junção das peles
explodindo uma só massa, juntos os dois,
Faz-se a luz de uma folha, contorno de pena.

sábado, 6 de outubro de 2007

Formosa dama ao som de cravo


Eu fujo mente
de beleza chama
todo inutilmente
de formosa dama.

Mas os olhos caem
braços em pernas
e corpo, pendem na
cabeça só olhos.

É um imenso giro
o salão em que eu
vejo a gente toda.

É um sonho apenas,
como em todo o rumo
tudo em si meus olhos.


sexta-feira, 5 de outubro de 2007

Sobre o tratado da fúria e da lentidão - parte I

O autor deste blog é um escritor. Como tal tem suas teorias próprias do que é ser escritor. Vejamos: uma pessoa se torna escritor aos poucos. Ninguém nasce escritor. Quando digo escritor refiro-me tanto aos que fazem poemas, como aos que fazem textos em prosa. E, ao se fazer escritor, aos poucos, uma "visão de mundo" vai se estabelecendo ao redor e dentro daquele que emite sua opinião por meio da palavra escrita. A partir deste momento teoria e prática se juntam, ao mesmo tempo que também não a mesmas coisa. O que o olho vê vai refletir no texto; o que o texto reflete nem sempre o olho vê. Além disso, há os outros sentidos do corpo que entram em ação. Estes sentidos reagem de diferentes formas, dependendo da época, das tecnologias, dos extra-sensorias próprios de cada momento da história. Um exemplo disso é nossa era atual. Vivemos a chamada era da informação, em que há muito estímulo visual. Desta forma, nosso olhos podem muito bem ser comparados com uma câmera. Já nossa imaginação, algo muito abstrato, pode ser a ilha de edição, escolhendo como queremos ver a verdade de uma determinada situação, de uma ação que está ocorrendo neste momento ou que já ocorreu mas não esquecemos por algum motivo forte. A história de vida de cada pessoa é que ajudará a selecionar em recortes, por parte da memória, os fatos, tranformando-os, assim, em fotos. Essas fotos, quando coladas, formam a película da vida, está tão fina e delicada vida que se posta em rotação (e realmente sempre está) faz-se filme, como qualquer outro que assistimos num cinema e cuja história sabemos que não é real. Repito o que já disse anteriormente: O que o olho vê vai refletir no texto; o que o texto reflete nem sempre o olho vê. O cinema é um olho mágico, uma lanaterna mágica que, antes de ir para as telas é um texto escrito. Só depois de ser construída a palavra no papel, temos a imagem. Assim, comparo o cinema a uma folha de papel em branco pronta para ser usada para que se possa, então, partir para a imagem da vida real.
O esquema fica assim:

Texto escrito antecede cinema
Cinema antecede vida

Ou

Texto está para cinema
como
Cinema está para vida

Mas onde quero chegar com toda essa divagação? Tudo isso não passa de uma teoria minha, válida só para mim, algo que tomo para meus poemas e meus textos em geral. Chamo a essa teoria de Teoria da fúria e da lentidão.
No próximo post explicarei porquê "fúria" e porquê "lentidão". Explicarei a razão destas imagens serem tão fortes em minha poesia que estão publicadas em livros e também podem ser encontradas no blog A Lanterna Mágica. Por enquanto é tudo e nada mais.


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